“É como se um interruptor fosse ligado e você instantaneamente começasse a sentir fome.”
Tanya Hall tentou parar de tomar medicamentos para emagrecer várias vezes. Mas toda vez que interrompe as injeções, o desejo intenso por comida retorna com força.
As injeções para emagrecimento, conhecidas como medicamentos GLP-1, conseguiram para muitas pessoas o que dietas tradicionais nunca haviam alcançado. O chamado food noise — o impulso constante de comer mesmo quando já se está satisfeito — simplesmente desapareceu.
Esses medicamentos deram a pessoas que nunca imaginaram emagrecer uma nova perspectiva corporal e, em muitos casos, uma mudança completa de vida. No entanto, ainda existe uma grande dúvida: é possível interromper o uso sem consequências?
Conhecidos por marcas como Ozempic, Wegovy e Mounjaro, esses medicamentos são relativamente novos, e os efeitos do uso prolongado ainda estão sendo estudados. As canetas injetáveis imitam o hormônio GLP-1, liberado após a alimentação, que ajuda a controlar o apetite e prolongar a saciedade. O Mounjaro atua também sobre outro hormônio, o GIP.
No Brasil, uma caneta de Mounjaro com quatro doses da menor concentração custa cerca de R$ 1.400, o que torna o uso contínuo financeiramente inviável para muitas pessoas. A questão então passa a ser: o que acontece quando o tratamento é interrompido?
Duas mulheres britânicas, com trajetórias distintas, relataram à BBC suas experiências. Tanya, gerente de vendas do setor de fitness, começou a usar Wegovy para provar um ponto. Ela acreditava que não era levada a sério profissionalmente por estar acima do peso.
Após iniciar o tratamento, ela afirma que passou a receber elogios e a ser tratada com mais respeito. Em poucos meses, perdeu cerca de 22 quilos, mas também enfrentou efeitos colaterais como náuseas, dores de cabeça, insônia e queda de cabelo.
Ao longo de 18 meses, Tanya perdeu 38 quilos e tentou interromper o uso várias vezes. Em todas, relata que o apetite retornava rapidamente, levando-a a comer em excesso poucos dias depois.
Segundo o clínico geral Hussain Al-Zubaidi, interromper o uso desses medicamentos pode provocar um retorno intenso da fome quase imediato. Estudos indicam que, entre um e três anos após a suspensão, entre 60% e 80% do peso perdido pode ser recuperado.
Outra história é a de Ellen Ogley, que começou a usar Mounjaro após chegar a um ponto crítico de saúde. Ela relata que sofria com compulsão alimentar emocional, mas que o uso do medicamento eliminou esse comportamento.
Durante o tratamento, Ellen mudou sua relação com a comida, passou a estudar nutrição e a adotar hábitos mais saudáveis. Ela reduziu a dose gradualmente antes de interromper o uso e perdeu 22 quilos inicialmente. Ao todo, já perdeu mais de 51 kg.
Mesmo assim, após parar a medicação, percebeu um leve aumento no peso, o que reforçou a importância do acompanhamento profissional. No Reino Unido, o órgão regulador NICE recomenda ao menos um ano de apoio contínuo após o fim do tratamento.
Para quem paga pelo medicamento de forma particular, esse suporte nem sempre está disponível. Tanya, por exemplo, afirma que não pretende interromper o uso por medo de recuperar o peso rapidamente.
“Passei 38 anos da minha vida acima do peso. Agora estou 38 quilos mais magra”, afirma. Ela reconhece que existe uma dependência emocional ligada ao medicamento e questiona se é ela quem controla a droga ou o contrário.
Especialistas alertam que a interrupção do uso precisa ser planejada. Sem mudanças sustentáveis no estilo de vida e apoio adequado, o risco de recuperação do peso é alto.
“A obesidade não é uma deficiência de GLP-1”, afirma Al-Zubaidi, destacando que o ambiente alimentar e social também influencia diretamente os resultados a longo prazo.
Fonte: G1
Gabriela
Foto: BBC

0 Comentários